Photo by Ícaro Martinelli
Valiant and beautiful: a poetic biography on a green turquoise background | Pedro Silva
─ But Linda, what makes you sad?
─ …
─ Linda?
─ …
That beat, the pause of a minute, of two minutes before the truth, the answer :”Lies, I think.” It all says a lot about Linda Valente, a Carioca artist for whom shadows seldom appear. The questions “What time is it in your pictures?” and “this one is sunset?” pointing to one of the white pictures in which we see the mountains of the Dois Irmãos (Two Brothers) in the picture’s field, with the beach beneath, thronged with people – identical black scrawls – casting long shadows onto the sand. Monochrome humans: a graphic presentation of the world as the artist sees it, the silhouettes of humans, shorn of their petty personal differences.
Linda is 33 years old and very, very Carioca. However tenebrist the human shapes are in her pictures, they are never cast on Linda. Sometimes she is sad, but doesn’t show it, not wasting time with shades of grey and instead going back to her usual palette.
Graduating from Rio’s Federal University’s School of Fine Arts from 2002 until 2009, Linda has a post-graduate diploma, enjoying courses at Parque Lage and studying design with Renato Alarcão. From this mix of ingredients came the series “Whites” in which illustrate the early definition of her style. Minimalist, the drawings are just outlines of objects from the real world. The colours dance and delight our gaze. Small bright dots in which we recognise the favela or luxury condominiums, united in colour. This is art produced by a woman of Carnival, of the beach, of music and friends, of nature trails and bikes.
Since 2002 Linda Valente’s pictures have been in the Copacabana Craft Fair, and are easily picked out from the crowd. In a space full of overlapping objects, her Whites both save and attract us. Before arriving at this series of drawings, Linda would paint Bahian women in multicoloured dresses and favelas with dark windows. Until one day a customer asked for something in black and white. How to represent Rio de Janeiro, a city with exaggerated natural beauty, only using black? The solution was striking- an ice tea vendor! With his two barrels hanging from his shoulders, standing out in the Ipanema crowd, we have Rio through the subtlety of its inhabitants. I must confess that I have never found this particular character in other artists. It was just a short artistic step from the black and white “Ice Tea Vendor” to colour, with her name, a gift from a mother of Manaus and father from Minas Gerais, coming from the generations that departed distant Lebanon and flowed into Guanabara Bay.
Her acrylic paints embellish the same planet in which she loves to travel. From the Chapada dos Veadeiros to France: a bike ride through Alamo Square in San Francisco, a lone empty tram on Lapa’s Arches, Paris under the gaze of a thoughtful gargoyle, a couple sitting on the promenade in Urca, a stroll in New York. A world that she paints but enjoys. Always with music around her, often singing carefree as if she was on stage. And if the song is good, it deserves to be danced to: and these shapes thrown through dancing will give rise to the paintings signed in gold to bring good luck.
But we can’t just analyse the exuberant and rich scenery that she passes through.
Another factor explains and nurtures the feeling you get: the abundance of friends. Meet Linda Valente at the Copacabana Market and suggest a walk to Bip Bip (an iconic bar where musical evenings have inspired loving paintbrush strokes). You’re bound to arrive late given the amount of hugs, quick chats and hellos that she gives out along the way. And the affection has no age limit. Even from those who call her “Auntie”. This sensitivity filled with joy is the same one that will produce one of the most beautiful views I’ve ever seen of Machu Picchu: the ruins surrounded by ancient green. We can feel the wet leaves in the rain and imagine insects flying overhead in a distant era.
One day I decided to compliment her on her canvases with the blue background. I was enchanted by the sky, its contrast with the green foliage, the yellow of the tram. There I was, completely taken, and she corrects me – without procrastinating over my naïve contemplation.
– It’s not blue. It’s turquoise green.
(June 2016)
Pedro Silva has been a writer since 2009 but until the other day he didn’t have consistency or discipline. He has left the art world several times: and it never worked out. He publishes the blog www.escrevendopedro.wordpress.com and has already had several articles published in literary journals. He is currently a member of the group “The Fifteen” made up of authors from different parts of Brazil. With meticulous critical processes and intense production meetings, the collective will launch in 2016 their first book in print, revised and commented on by the literary critic José Castello. He has smiled a lot.
Translation by @joeventos_ltd
Valente e linda: biografia poética sobre um fundo verde turquesa | Pedro Silva
─ Mas, Linda, o que te deixa triste?
─ …
─ Linda?
─ …
Os dois minutos de silêncio entre a pergunta e a resposta “acho que mentiras” contam muito sobre Linda Valente, artista plástica carioca para a qual raras vezes as sombras aparecem. “Que horas são nos seus quadros?”, “Neste aqui é pôr-do-sol” e aponta para um dos Brancos nos quais vemos o Dois Irmãos ao fundo, o contorno da praia e diversos humanos – manchas pretas idênticas – projetando longas sombras sobre a areia. Monocromáticos humanos: apresentação gráfica do mundo como a artista o vê, sem diferenças que devessem nos afastar.
Linda tem 33 anos e é carioca – muito. As sombras que rareiam em suas figuras humanas tampouco a habitam. Às vezes fica triste, mas esconde, não perde tempo com os tons de cinza e retorna à sua paleta habitual.
Formada pela Escola de Belas Artes da UFRJ, a qual cursou de 2002 a 2009, Linda é pós-graduada em licenciatura, circulou pelos cursos do Parque Lage e estudou desenho com Renato Alarcão. Do caldo de tudo isto, nasceu a série de “Brancos” nos quais rapidamente reconhecemos seu estilo. Minimalista, os desenhos são apenas perímetros das coisas do mundo real. As cores dançam e alegram nosso olhar. Pequenos pontos coloridos pelos quais reconhecemos a favela ou os prédios de luxo: ambos habitados pelo mesmo colorido. Arte de uma mulher do carnaval e da praia, da música e dos amigos, das trilhas e das bicicletas.
Desde 2002 os quadros de Linda Valente estão na Feira de Artesanato de Copacabana e facilmente se distinguem do todo. Num espaço polvilhado de objetos que se encavalam, seus Brancos nos salvam e atraem. Antes de chegar nessa série, Linda passou por baianas multicoloridas e favelas com janelas escuras. Até que um dia um cliente solicitou algo em preto e branco. Como representar o Rio de Janeiro, cidade na qual a natureza exagera em ser bonita, trabalhando apenas com o preto? A solução foi marcante: um vendedor de mate! Com seus dois barris pendendo dos ombros e destacando-se na multidão de Ipanema, temos o Rio na sutileza de seus habitantes. Confesso que nunca encontrei em outros artistas esse personagem singular. Do “Vendedor de Mate” para as cores foi apenas um curto passo artístico, seu nome , presente da mãe manauara e do pai mineiro, herança de gerações que partem do distante Líbano e desembocam na Baía da Guanabara.
Suas tintas acrílicas embelezam o mesmo planeta no qual ela gosta de viajar. Da Chapada dos Veadeiros à França: um passeio de bicicleta na Rua Álamo em São Francisco, um bonde solitário e vazio sobre os Arcos da Lapa, Paris sob a ótica de uma gárgula contemplativa, um casal na mureta da Urca, uma caminhada em Nova York. Mundo que ela pinta, mas também desfruta. Sempre com música ao redor, não é raro vê-la dublando despreocupada como se estivesse no palco. E se a música é boa, merece ser dançada: dos movimentos deste corpo que baila nascerão as telas assinadas em dourado – para dar sorte.
Mas não podemos analisar apenas a geografia exuberante e rica pela qual trafega. Outro componente explica e alimenta seu sentir: a profusão de amigos. Encontre com Linda Valente na Feira de Copacabana e proponha uma caminhada até o Bip Bip (icônico bar cujos encontros musicais também já inspiraram seus carinhos em formato de pinceladas). Seguramente você chegará atrasado dada a quantidade de abraços, pequenas conversas e alôs que ela distribuirá no meio do caminho. E não importa a idade dos afagos. Até aos que a chamam de “tia”. Essa sensibilidade recheada de alegria é a mesma que produzirá uma das mais lindas visões que já tive de Machu Picchu: as ruínas cercadas por um verde ancestral. Sentimos as folhas molhadas pela chuva e podemos nos imaginar como insetos sobrevoando aquelas paragens em um tempo muito distante.
Um dia resolvi elogiá-la pelas telas com o fundo azul. Encantei-me com o céu, seu contraste com o verde das folhagens, o amarelo do bonde. Eu ali, tomado, e ela me corrige – sem procrastinar frente à minha ingênua contemplação:
– Não é azul. É verde. Verde turquesa.
(texto de junho de 2016)
Pedro Silva escreve desde 2009 mas até outro dia não tinha constância ou disciplina. Já se afastou do mundo das artes algumas vezes: em todas se deu mal. Publica no blog www.escrevendopedro.wordpress.com e já teve alguns textos divulgados por revistas literárias. Atualmente integra o grupo “Os Quinze” composto por autores de várias partes do Brasil. Com meticuloso processo crítico e intensos encontros de produção, o coletivo lançará em 2016 seu primeiro livro impresso com revisão e comentários do crítico literário José Castello. Tem sorrido bastante.